Lisérgico. Esta é palavra que define Alice Live. Feito da união entre música, teatro de bonecos e animações projetadas, o espetáculo realizado pela companhia de teatro Giramundo em parceria com a banda Pato Fu traz uma mistura de sensações e texturas em mais uma releitura do clássico Alice no País das Maravilhas, de Lewis Carroll. A combinação de sonoplastia, vídeos, bonecos e atores confere uma aura especial ao espetáculo, que, apesar de dispensar rótulos, se aproxima de um musical com processos de montagem cinematográficos. O evento aconteceu no último sábado, 21, no Cine-Theatro Central.
A apresentação do Giramundo é digna da fama que a companhia carrega. Ótima sincronia dos elementos visuais no show de marionetes conduz bem o espetáculo. A psicodelia das projeções faz com que o espectador se sinta realmente no País da Maravilhas. O roteiro poderia ser melhor trabalhado. A história de Lewis pretende atingir a todos os públicos, sendo prazeroso tanto para o público mais jovem, por sua incrível fantasia metafórica sobre transformações, quanto as gerações mais antigas, por conter forte teor crítico, político e lógico (enigmas). Contudo, por momentos, Alice Live não conseguiu contemplar nenhum dos dois.
Sonho realizado
Em entrevista à Pró-reitoria de Cultura, Fernanda Takai, cantora e compositora do Pato Fu, explica que a ideia para o espetáculo vem de um sonho antigo de Marcos Xuxu, um dos diretores do Giramundo, e que o projeto já vem sendo amadurecido há cinco anos. “A gente já pensa nesta ideia desde a época do nosso álbum Música de Brinquedo, e o objetivo era fazer um espetáculo multicoisas, mais do que multimídia. A composição é inédita, feita principalmente pelo John Ulhoa com algumas letras minhas. O espetáculo era complexo, então teve que ser feito aos poucos”.
A vocalista diz ainda que o carinho entre Pato Fu e Giramundo já vem desde 1993, ano em que a banda lançou seu primeiro disco, Rotomusic de Liquidificapum. “Nosso primeiro contato foi no lançamento do nosso CD, em Belo Horizonte, quando alguns integrantes da companhia subiram ao palco para participar. Começamos a trabalhar juntos pra valer só em 2010, no nosso álbum Música de Brinquedo. O Pato Fu é muito fã do Giramundo e o Giramundo é muito fã do Pato Fu”.
As canções têm letras selecionadas do texto original de Lewis, interpretadas através do rock progressivo/psicodélico, cantado muitas vezes em inglês, que enfatiza o tom fantástico e lúdico da obra, explorando sonoridades e jogos de palavras. A produção explora as músicas cantadas ao vivo por Fernanda Takai, no papel de Alice, junto à voz gravada de Arnaldo Baptista como Chapeleiro Louco. Presente à apresentação no Central, Arnaldo assistia atenciosamente à performance na plateia.
Fernanda conta que a experiência com o teatro tem sido um ótimo exercício e que tem gostado do resultado. “É tentativa e erro. Alguns dias são melhores que outros, mas acho que a ideia é puxar essa outra faceta. Já dublei filmes longa-metragem e temas de televisão, mas aparecer assim, como faço no Alice Live é diferente. Estou achando esta etapa da minha carreira muito interessante”.
Universal
Publicado em 1865, Alice no País das Maravilhas alcançou sucesso mundial com seu célebre estilo nonsense, que projeta alusões satíricas de paródias e poemas ingleses ensinados no século XIX, além de referências linguísticas e matemáticas aplicadas em enigmas dentro do livro. A obra é de difícil interpretação e traz diversas perspectivas sobre um mesmo tema.
John Ulhoas, guitarrista do Pato Fu, revela que a trilha sonora é fruto do carinho que tem pela obra. “Eu consigo me lembrar de muitas coisas relacionadas a Alice no País das Maravilhas. É uma coisa que eu gosto de consumir. Alice, pra mim, tem aquilo que as peças, filmes e livros buscam: a aceitação universal. Quando um adulto leva uma criança para assistir, ambos gostam, mas de modos diferentes”.
Foto: Marcelo Riceputi
Matheus Medeiros