Publicado em 1° de abril de 2019
O público juiz-forano lotou o Cine-Theatro Central, no último sábado, 30, e vibrou com a apresentação de Valencianas, a parceria entre Orquestra Ouro Preto e Alceu Valença que percorre o país há sete anos. O espetáculo que combina música erudita e popular, com arranjos para concerto de hits do cantor e compositor pernambucano, como Morena Tropicana, Girassol, La Belle de Jour e Anunciação, agitou a primeira noite de comemorações dos 90 anos do Cine-Theatro Central, inaugurado em março de 1929. Mais de 1700 pessoas assistiram ao espetáculo, cantando muitas vezes com Alceu as letras de suas mais famosas canções e aplaudindo com entusiasmo o cantor e os músicos da Orquestra.
A euforia, porém, começou muito antes: com entrada franca, a disputa pelos ingressos, garantidos através de sorteios para o público interno e externo à Universidade Federal de Juiz de Fora, – além de alguns entregues a convidados de honra – começou no dia 22 e se estendeu até a data do evento, quando o anúncio da distribuição de 60 convites individuais remanescentes levou dezenas de pessoas a se postarem diante da bilheteria desde o meio-dia. À noite, uma fila longa se estendia na Praça João Pessoa e avançava pelo Calçadão. Quem persistiu ainda conseguiu entrar, graças à abertura da Galeria, autorizada para o evento mediante acordo entre o teatro, o Ministério Público e o Corpo de Bombeiros.
“É importante para a Universidade proporcionar um espetáculo dessa magnitude de forma gratuita para a comunidade juiz-forana e fizemos questão de que os ingressos fossem sorteados, não apenas para o público institucional e para o patrocinador (Unimed), mas também para a população em geral”, ressaltou o diretor do Central, Luiz Cláudio Ribeiro (Cacáudio), que considera o estilo do show, por si só, um grande colaborador do objetivo de levar o povo ao teatro: “É uma orquestra, que tem um caráter erudito, e o Alceu, que tem um caráter popular. O teatro tem esse lado da erudição e da arte, mas é cada vez mais do povo também”. Cacáudio destacou igualmente o evento do dia seguinte, uma edição aberta do projeto Palco Central, na Praça João Pessoa: “A ideia é possibilitar a ocupação e o acesso ao teatro de diversas maneiras”.
Na plateia de Valencianas, o casal de engenheiros Rita Valéria e Paulo Villela, brindados no sorteio com um par de ingressos, recordava seus melhores momentos no Central: Rita destacou a sua formatura e a dos irmãos, enquanto Paulo relembrou os tempos em que o espaço funcionava também como cinema. Por outro lado, na fila à espera da abertura das portas para o público entrar, aguardava também a jovem pianista Grazi Elis, fã de Alceu e da Orquestra. Apesar de não ter conhecido o passado do teatro, a pianista tremia de ansiedade pelo momento, que entraria para seu acervo de histórias no Central. Ela assistiu ao show várias vezes no Youtube e, quando soube que o espetáculo viria a Juiz de Fora, tentou o sorteio, sem sucesso. Porém, não desistiu e correu para a bilheteria na tarde do dia 30, conseguindo um dos ingressos remanejados.
Convidados de honra do teatro, o casal de restauradores Martha e Massimiliano Fontana, responsáveis pelas reformas do Cine-Theatro Central em 1996 e 2015, estava muito emocionado com a celebração dos 90 anos. Além da expectativa pelo show Valencianas, os restauradores demonstravam, acima de tudo, grande felicidade por mais uma vez entrar no teatro que os tem em sua própria história. “Eu amo esse lugar!”, afirmou Martha.
Todos os andares do Cine-Theatro Central foram ocupados, como não ocorria desde outubro de 2016, em razão da interdição dos pisos superiores para adequação do espaço a normas de segurança atuais. O balcão nobre foi liberado ao público, pelo Corpo de Bombeiros, no dia 16 de março. Em Valencianas, além do balcão e da plateia, – que nunca esteve interditada durante funcionamento do teatro – a galeria também foi aberta ao público. Brigadistas acompanham os eventos do Central, presencialmente, há quatro anos. “Nós trabalhamos com prevenção e primeiros socorros”, diz a bombeira civil Edna Monteiro, que acrescenta: “O Teatro é área protegida da Unimed e, em qualquer situação de emergência, nós entramos em contato e o atendimento é imediato”.
A UFJF e a cultura
Presente também na noite festiva, o Reitor Marcus David fez suas considerações sobre o papel da UFJF como gestora do teatro, que faz parte da instituição há 25 anos, e de outros espaços em Juiz de Fora: “A Universidade cumpre um papel muito importante, além da sua função de ensino, de pesquisa e extensão, que é como vetor de desenvolvimento da cultura na cidade, de democratização do acesso à arte. Ter um patrimônio como o Cine-Theatro Central sob responsabilidade da Universidade nos enche de orgulho e conseguir mantê-lo da forma e com a qualidade que estamos mantendo, com uma vida cultural tão intensa, é uma contribuição para a toda a região”.
O maestro da Orquestra Ouro Preto, Rodrigo Toffolo, afirma que “sua vida musical se confunde com a da cidade”, por ter frequentado diversas edições do Festival Internacional de Música Colonial Brasileira e Música Antiga em Juiz de Fora, desde a infância e por mais de dez anos, como estudante de música, e por já ter trazido, várias vezes, a Orquestra ao Central. “Estar aqui hoje é uma alegria enorme, porque todas as lembranças vêm à mente: a cidade, as pessoas, o calçadão… É um sentimento de dever cumprido voltar 25 anos depois de vir pela primeira vez, para se apresentar numa casa cheia.”
A orquestra, que completa 20 anos, tem como ideal “tornar a música erudita menos quadrada e a música popular menos flexível”, define o maestro. Essa é também a proposta de Valencianas, que surgiu em 2012, para comemorar os 40 anos de carreira de Alceu Valença, a partir da amizade entre os dois, que foram apresentados por Paulo Rogério Lage, atual diretor do espetáculo. A parceria é um sucesso por onde passa e o CD do projeto ganhou o Prêmio da Música Brasileira de 2015. Desta vez não poderia ser diferente: “Essa foi uma noite muito especial, porque estávamos precisando dessa alegria e união. As pessoas, quando estão num teatro, cantam junto e essa catarse coletiva é muito importante”.
Parceria
Em entrevista, a Pró-Reitora de Cultura Valéria Faria disse que “é um privilégio administrar um espaço suntuoso como este, ao mesmo tempo em que é uma grande responsabilidade. O Cine-Theatro Central está sob coordenação da Pró-Reitoria de Cultura da UFJF, mas ele é um bem da cidade, se destacando como um dos principais teatros do país. Portanto é uma honra, mas também um desafio cuidar desse lugar tão expressivo.” A respeito da conquista do espetáculo Valencianas para esta ocasião, Valéria lembrou a dificuldade do sistema público para conseguir títulos específicos como este, mas ressaltou que a organização foi executada através de parceria alcançada por edital público e com o patrocínio da Unimed. A partir daí foi “possível realizar o show desejado, sem problemas de gerenciamento”.
Já no palco, antes do início do show, a Pró-Reitora fez um breve discurso de agradecimento à patrocinadora Unimed, que possibilitou a entrada gratuita ao evento, ao Reitor Marcus David e à Vice-Reitora Girlene Alves, por sempre apoiarem as iniciativas da Procult, à Pró-reitoria de Infraestrutura, ao Corpo de Bombeiros, ao Ministério Público Federal, à Funalfa, à Fadep e ao Iphan, “pela dedicação e empenho ao longo do complexo processo de adequação de uma construção antiga e tombada às normas de segurança contemporâneas”, também aos apoiadores Victory Hotel e Rádio Itatiaia, e especialmente a todo o público presente. A pró-reitoria também anunciou a chegada de uma exposição permanente no Central, que contará com 30 obras do pintor Angelo Bigi, autor da pintura ornamental do Cine-Theatro Central, doadas pelo arquiteto e colecionador Antônio Carlos Duarte. A notícia foi saudada pela plateia, abrindo uma noite de muitos aplausos, emoções e alegrias que, como antecipou em sua fala o diretor Luiz Cláudio Ribeiro (Cacáudio), já entrou para a história do Cine-Theatro Central.
Outras fotos do evento estão disponíveis em: https://www.flickr.com/photos/ufjf/with/46599002825/
Texto: Raissa Segantini